CINEMA
Pernambucano Boa sorte, meu amor estreia no Cinema da Fundação
Filme foi premiado em Locarno e no Festival de Brasília
Publicado em 30/08/2013, às 06h02, no JC Online
Ernesto Barros
Com
cerca de 10 longas-metragens produzidos ao ano, a cinematografia pernambucana
se destaca pela diversidade de olhares e propostas. Apesar de saudável, essa
regra nem sempre deve ser levada ao pé da letra. Sem muita explicação lógica,
os filmes se relacionam entre si para além da vontade de seus autores e formam,
às vezes, corpos que se correspondem. Politicamente. Socialmente.
Artisticamente.
Três
filmes pernambucanos, realizados no ano passado e explorados comercialmente em
2013, são irmãos siameses em toda sua extensão física. Um deles, muito visto e
badalado com muita justiça, é o arrasador O
som ao redor, de Kleber Mendonça Filho. Seus outros dois irmãos
começam agora a serem conhecidos do grande público. O primeiro é Boa sorte, meu amor, de
Daniel Aragão, que estreia nesta sexta (30/08) no Cinema da Fundação. O outro é
Eles voltam,
de Marcelo Lordello, ainda inédito no circuito, mas com data de estreia para
muito breve.
Mas
o que eles têm em comum além do fato de serem filmes pernambucanos? Mesmo numa
rápida olhada, os três longas capturam uma fissão, quase geológica, que marcou
nossa formação política e socioeconômica. Independentemente de seus estilos,
cores e ritmos, nos vemos capturados em nosso passado escravocrata e
coronelista – seja no Agreste, no Sertão ou na Zona da Marta –, que tem o
Recife como epicentro de séculos de diferenças. Vimos isso na milícia urbana de
O som ao redor,
na brancura profunda do Sertão de Boa
sorte, meu amor, e na miséria das bordas da zona canavieira em Eles voltam.
Boa
sorte, meu amor,
assim como os outros dois filmes, fogem a nomenclaturas. São filmes estranhos,
incômodos, ferinos – se assemelham a pedras cheia de quinas, daquelas que
cortam por todos os lados. No Festival de Brasília, quando foi exibido pela
primeira vez no Brasil para uma grande plateia, o filme surgiu como um disco
voador no Planalto Central.
Assim
como O som ao redor,
Boa sorte, meu amor
também é estruturado em três tempos. São filmes extremamente sonoros, musicais
e sensoriais (no bom sentido da palavra). Nos dois primeiros tempos, o cineasta
deixa entender que irá enveredar para uma história de amor nos tempos do cólera
no Recife, uma cidade cada dia mais desfigurada pela sistemática destruição de
sua memória urbana e a construção de pilastras de concreto e metal. No entanto,
quando se esperava a continuidade de um romance normal, embora complicado,
Daniel nos leva para uma descida aos infernos.
Por
meio de dois personagens jovens – que têm suas raízes no Sertão do Estado, mas
que vivem no Recife – , Daniel faz de Boa
sorte, meu amor um tratado etnológico sobre seres com a psique
entulhada de tradição, nome e propriedade. Ensimesmado pela certeza da falência
amorosa, o personagem Dirceu (Vinicius Zinn, da série Alice, da HBO) não
consegue se apegar a coisas – vive num apartamento semivazio – nem a pessoas.
Mas quando ele vê Maria (a beldade Christiana Ubach), uma garota de rosto
angelical que vive de bicos como promotora de ponto de vendas, ele sai da
inércia.
Filmado
em um preto e branco e expressionista em suas intenções, Boa sorte, meu amor é um
fascinante retrato da alma atormentada do ser humano.
Fonte: http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/cultura/cinema/noticia/2013/08/30/pernambucano-boa-sorte-meu-amor-estreia-no-cinema-da-fundacao-95523.php.
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